Para estimular o espírito empreendedor dos jovens brasileiros,
não basta o ensino puro e simples do tema em escolas e universidades. Segundo
Tina Seelig, diretora-executiva de um dos mais conceituados centros de
empreendedorismo do mundo, o Stanford Technology Ventures Program, os negócios
inovadores só surgem em um ambiente que ofereça leis favoráveis, fontes de
financiamento e, principalmente, exemplos de sucesso a serem seguidos. "No
caso de Stanford, estamos muito bem servidos", diz Tina.
E estão mesmo. Do campus da
Universidade de Stanford em Palo Alto, no coração do Vale do Silício, na
Califórnia, saíram os criadores de algumas das empresas mais valiosas do mundo
hoje, como Yahoo! e Google. A diretora-executiva está no Brasil para participar
do Roundtable on Entrepreneurship Education, encontro internacional de
empreendedorismo que acontece no Rio de Janeiro. Nessa entrevista ao Estado,
ela falou sobre a receita de empreendedorismo bem-sucedido da Universidade de
Stanford e a sua percepção sobre os empreendedores brasileiros.
O programa de empreendedorismo da
Universidade de Stanford é um dos mais conceituados no mundo. O que levou a
esse sucesso?
Somos sortudos de estar no Vale do
Silício. Aqui há uma rica força de empreendedores, além de todo o universo de
empreendedorismo ao redor deles, com laboratórios e empresas maravilhosas. Mas,
além disso, procuramos olhar não apenas para o que está acontecendo aqui.
Estamos constantemente colaborando e trabalhando com uma comunidade de
educadores na América Latina, Europa e Ásia, com quem aprendemos o tempo todo.
Google e Yahoo, algumas das mais
brilhantes empresas de inovação, surgiram em Stanford. O que Brasil precisar
fazer para produzir histórias semelhantes?
É muito importante ter um exemplo
a ser seguido. Creio que a existência de casos bem-sucedidos no nosso ambiente
estimula os jovens empreendedores, que acabam usando essas experiências como
referência. Isso também tem que existir no Brasil.
O que podemos aprender com a
experiência de Stanford no ensino do empreendedorismo? É realmente possível
ensinar e aprender esse conceito?
Sim. Em anos de experiência, aprendi
que o mais importante no ensino do empreendedorismo é dar ao estudante a
oportunidade de fazer ele mesmo. Em Stanford, fazemos isso desafiando o aluno
em tarefas onde é necessário correr riscos, em atividades que nunca precisou
fazer antes. Além disso, estimulamos que ele assuma posições de liderança
dentro da universidade. Essa vivência prática permite que, quando saiam do
ambiente universitário, sejam empreendedores de verdade - e não apenas tenha
falado em como ser um bom empreendedor.
Qual o peso da questão cultural no
empreendedorismo?
Em qualquer país, um dos maiores
entraves ao empreendedorismo é a resistência a assumir riscos. Quando se começa
um novo negócio, é provável a chance dele não ir pra frente. Por isso, mais que
cultura, creio que o que se precisa para termos mais empreendedores é um
ambiente com menos riscos e que dê suporte a eles, mesmo que fracassem.
Na opinião da sra., o brasileiro é
um povo empreendedor?
Sem dúvida. Parece haver um forte
espírito empreendedor em seu país. Os brasileiros são entusiasmados e têm uma
paixão vibrante. Porém, mais que isso, existe um desafio que é o entorno desse
empreendedor. É preciso achar o caminho para fazê-lo ter êxito nesse desejo. E
isso tem a ver com financiamento, com ambiente social e com leis que permitam
aos novos empresários levarem seu negócio para frente.
De que forma o ambiente econômico
influencia o empreendedorismo em um país?
De um bilhão de formas diferentes.
O modelo que fez o sucesso do Vale do Silício, por exemplo, é algo complexo.
Ele é formado por vários organismos que precisam se mover juntos, de forma a
criar um ambiente saudável e dar suporte às atividades dos empreendedores. Por
isso, além, obviamente, da existência de empreendedores, é preciso existir
também os donos do capital de risco, os advogados, os conselheiros, os bancos,
os profissionais qualificados.
No Brasil, o empreendedorismo
ainda é pouco ensinando aos jovens. Ter contato com esse assunto desde cedo,
nas escolas, influencia a chance de sucesso de o empreendedor ter sucesso em
seu negócio?
Não se aprende empreendedorismo
somente na sala de aula, mas também com o que se lê nos jornais e TVs e se
conhece na sua comunidade. Se há um modelo a ser seguido na minha comunidade,
que mostre que é possível ter meu próprio negócio, esse modelo vale mais que
qualquer disciplina escolar. Na região do Vale do Silício, ser empreendedor é
algo muito aceitável. Faz parte do DNA daquele ambiente.
Quais os maiores obstáculos para
um melhor desenvolvimento do empreendedorismo no Brasil?
A maior dificuldade está no estado
de espírito das pessoas, que ainda temem assumir riscos frente à possibilidade
de não suceder. Assumir risco é tudo que o empreendedor faz. E você precisa ter
uma cultura que dê suporte a isso.
Fonte: O Estado de São Paulo
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